Crianças também
convertem tensões emocionais em doenças. Com certa freqüência, pediatras e
dermatologistas encontram manifestações cutâneas de conflitos, temores e
preocupações.
Há pais que ficam surpresos,
quando se afirma que a dermatose apresentada pela criança é reflexo de estados
psicológicos vividos pelo paciente. Às vezes, argumentam que a criança não tem
motivo de estresse, porque não lhe falta nada. Esses pais entendem que só o
mundo dos adultos oferece ameaças ou motivos de pressão. É preciso lembrar,
porém, que as crianças têm seu mundo mental e que são vulneráveis ao que se
passa ao seu redor, porque dependem inteiramente dos adultos, não tendo como se
defender. Para uma criança, as coisas que se passam com ela e os fatos que
atingem os adultos dos quais dependem significam ameaças incontornáveis.
Fantasias
O mundo mental das
crianças tem mais fantasias do que realidades. Se a criança recebe estímulos
que geram fantasias ameaçadoras, cria medos infundados, mas que funcionam como
realidade para elas. Recorde-se que o cérebro não analisa as imagens mentais;
todas são por ele tomadas como realidade. É o caso do bicho papão, história
utilizada para tornar a criança "boazinha", a qual passa a funcionar
como uma censura interna para qualquer desobediência. Outras histórias
assustadoras, bem como ameaças, tratamentos ríspidos, apelidos humilhantes,
exigências descabidas, atribuição de deveres que cabem a adultos vão criando
temores, insegurança e inibições e, conseqüentemente, estresse.
Contato físico
Aspecto importante é a
falta de contato físico, que, durante algumas gerações, foi ensinada de pais
para filhos com a finalidade de não deixar a criança manhosa. Ainda hoje há
quem acredite nisso. Na verdade, essa atitude gera insegurança, porque a
necessidade de contato faz parte da natureza humana e é essencial na infância.
Também o afastamento
muito precoce da mãe, por motivo de trabalho, e a colocação da criança numa
creche logo aos quatro meses de idade é uma situação da qual a criança se
ressente, pois ela precisa da presença da mãe para saber que tem controle da
situação, para ter certeza de que, quando necessitar, a mãe estará ali para
atendê-la. Além disso, sempre que a mãe se afasta a criança não sabe quando ela
voltará ou se voltará. Sua sensação é de abandono. Tudo isso cria estresse.
Família
Presenciar desajustes
familiares, como discussões e brigas entre os pais ou outros familiares, viver
em ambiente de desavença doméstica e a presença de pai alcoólatra, que é uma
desgraça em qualquer família, produz sensação de incerteza e insegurança, que
mantém o organismo da criança sob estresse constante.
Fatores externos
Problemas externos, como
falta de ambientação na escola maternal ou no jardim de infância, situações
extremas, como assistir a um assalto à família ou a violência em casa, são
outros elementos causadores de estresse.
Na atualidade, quando as
crianças são submetidas a uma tremenda carga horária de televisão, os desenhos
infantis, que são ricos em cenas de agressividade e maldades, além de figuras
horrorosas e de monstros, constituem uma fonte de medo noturno e tensão.
A troca de escola, por
ocasião de mudança da família, também pode gerar insatisfação, tristeza pela
perda de um ambiente ao qual a criança estava acostumada e constrangimento por
colegas inamistosos. Todos são fatores de estresse.
Qualquer que seja a
origem da tensão a criança não tem recursos para se adaptar facilmente. A
depender de sua habilidade, e também do trauma gerado pelo fato, a criança pode
desenvolver sintomas psicossomáticos. No Japão, onde a educação é muito rígida
e as crianças são impiedosamente exigidas na escola, tem sido observado um
aumento de casos de gastrite e úlcera péptica em pequenos pacientes.
É preciso não esquecer
as manipulações por meio de vergonha e culpa e, ainda, a ameaça de a criança
perder o amor dos pais, se não agir da maneira prescrita. Isso leva a uma
pressão muito grande e obriga a criança a estar o tempo todo tentando adivinhar
o que os pais querem que ela faça para continuarem a amá-la.
Outra fonte de estresse
é a perda de algum familiar pelo qual a criança tenha grande afeição. A
tristeza que se segue ou a confusão mental criada pela ausência da pessoa sem
que a criança saiba para onde foi geram uma tensão, que se prolonga por muito
tempo.
Enfim, razões para
estresse a criança tem em abundância e não possui meios para enfrentá-lo. Em conseqüência
disso, muitos quadros clínicos infantis estão relacionados com situações
emocionais vividas pela criança.
Manifestações cutâneas
Na pele, as
manifestações mais comuns atingem o couro cabeludo, o pigmento cutâneo, unhas e
peles hipersensíveis.
No couro cabeludo são
freqüentes quedas de cabelo localizadas, que formam áreas círculares lisas, desprovidas
de folículos pilosos. É um quadro chamado pelada ou alopecia areata. Não há demonstração
científica de que esta alteração é diretamente provocada pelo estresse, mas há
freqüente coincidência da instalação de pelada com fases de estresse intenso. Isso
leva à suposição de que haja uma correlação direta entre um fato e outro.
Também no couro cabeludo
há um distúrbio curioso, que é o arrancamento de cabelos ou tricotilomania. A
diferença para a pelada
é que nesta alteração as áreas em que os cabelos foram arrancados são
irregulares ou têm um desenho caprichoso e possuem cabelos normais, que ainda
não foram arrancados. Surge de um tique nervoso, que a criança desenvolve, de
puxar os cabelos por motivo da tensão. As sobrancelhas e os cílios também são arrancados,
muitas vezes isoladamente.
O pigmento da pele, a
melanina, é afetado em muitas crianças, que desenvolvem o quadro do vitiligo.
Nem sempre existe estresse por trás do vitiligo, de modo que não se justifica a
atitude de encaminhar toda criança com esta doença para psicoterapia.
Entretanto, quando o estresse tem papel relevante, um terapeuta deve fazer
parte do tratamento instituído.
As unhas são o tecido
mais comumente agredido. É muito grande o número de crianças que aprende a
desviar suas tensões para as unhas e cria o hábito de roê-las. Isso pode se
transformar em verdadeira compulsão, que só a custa de muito esforço ou de
psicoterapia será resolvido.
As peles hipersensíveis
ou alérgicas sofrem uma influência imediata e intensa dos estados de tensão
vividos pela criança. Um paciente com dermatite
atópica ou sujeito a crises de urticária terá sua condição agravada e
crises serão desencadeadas por influência de tensões emocionais. É muito
difícil evitar a agudização dos processos, porque algumas crianças recebem,
muitas vezes, a carga das tensões familiares; são o pára-raios da família, e,
não tendo como resolver os problemas da família, desviam a pressão para seu
próprio organismo. Uma pele hipersensível é o órgão de choque para descarregar
essas tensões.
Outras manifestações
ocorrem, dependendo da reação momentânea da criança. É, pois, importante levar
em consideração o estado emocional da criança para evitar doenças
psicossomáticas e para aliviar a carga que as emoções podem acrescentar a
doenças existentes.